Os fenómenos mainstream são um sub-produto de sub-culturas. Mas isso não é o mesmo que dizer que as manufacturas das sub-culturas pertencem uma zona de ensaio de fórmulas que funcionam na maioria das situações. Diz-se, então, que os produtos globais, aqueles consumíveis pela massa populacional desinformada dos contexos onde os produtos foram criados, são uma coisa passível de leitura "sem preocupações de causa e de de efeito" (citando Heitor Alvelos). Os produtos são autónomas porque podem ser lidos sem introduções nem epílogos que os apresentem, não recolhessem os seus produtores conclusões testadas nos mais restritos ambientes, não soubessem eles mais que muitos empresários da indústria do entretenimento que em vão tentam recorrer a uma disciplina chamada Marketing que não passa de uma introdução muito, mas mesmo muito, arcaica à economia da cultura.
Uma cave fechada a sete chaves não é senão um laboratório com mais impurezas. Menos falível que um teste de estúdio de uma multinacional. O estúdio é o laboratório que cria a fórmula, a cave é o país terceiro-mundista, em vias de desenvolvimento, que lhe serve a inspiração, confirma a atitude prometendo mercado.
Não voltamos ao mesmo. Nos zeros (the 00's), não podemos pensar que a zona de ensaios, está isenta de moral ou consciência.
Isto é: o terreno intermédio que a ideia ocupa por si mesma não é alheio a uma série de mandamentos por escrever, subentendidos nos actos, nos modos, enfim na cultura.
Isto não é: a ideia que funciona sem o tradicional conhecimento do universo do emissor é sempre despida de ética.
Prefiramos antes julgar como bom serviço o código por que nos vamos entendendo. Aquele que os produtores de cultura massificada disponibilizaram, aquele que decidimos usar e fomos enriquecendo. Quantos contos e fábulas perdidos num país nórdico não foram re-apresentados pela Universal City Studios. E o que seria da Alice e do País das Maravilhas se a Disney não nos pusesse a coisa em cassete e DVD.
Quem estuda comunicação não pode desinteressar-se pela problemática inerente à tradução da mensagem, ao meio que a veícula, como dizê-lo,,, ... ao conjunto de novas possibilidades narrativas que aprendemos a fazer na passagem da conversação directa, debate onde o entendimento contextual é colectivo, para a comunicação em que o afastamento entre o emissor e o receptor é dado adquirido a priori.
No processo distanciado, o desconhecimento da autoria (desinformação inicial) e a dúvida presente até ao momento em que a reação é recebida (feedback que confirma o sucesso ou insucesso da transmissão) geram um imenso campo de actividade ainda pouco explorado no design português e na grande maioria dos produtos comunicativos portugueses. Este momento acarreta consigo a natural intensidade da espera que reside entre o momento em que o grito para o vazio é lançado até ao momento em que ele regressa, que pode ou não ser enriquecido. Com menos poesia: quem ousa a fala, não fala por falar... Assim o sucesso da transmissão da mensagem, já não pode depender da sua forma. Ele depende mais do seu conteúdo, tema, relevância que do seu desenho. Assim como a um mensagem sem interesse e bem cantada só não ecoa porque o emissor lhe vira as costas assim que a lança.
O decorativismo tem por isso sido cada vez mais abordado por um conjunto de produtores portuenses não como o que o seu próprio nome indica, mas como um arranjo, aparentemente fútil, que se arma de pequenos signos que, mais que seleccionarem à partida o público, o agarram dentro dos interesses dele próprio. O pormenores dizem agora respeito ao cerne da mensagem porque o objecto do criador do conteúdo ornamenta-se cada vez mais profundamente. Ainda assim a responsabilidade está neste meandro tanto no emissor como no receptor. Sim. No receptor, que não deve apenas reclamar a informação como um direito mas que deve antes tentar compreender o processo comunicativo como um projecto conjunto do qual faz parte, podendo contribuir para a criação de uma cultura auto-sustentável porque orgânica e fluída.
Vou dormir Bigodeiros mas isto continua...